quarta-feira, novembro 22, 2006

Ainda o Caminho...

Ao longo do Caminho, fiz várias vezes uma lista mental das coisas que mais me agradavam e daquelas de que, por um motivo ou outro, eu não gostava.

Na lista dos "mi don't laiki" estavam:
- o ressonar dos companheiros nos albergues
- ter de lavar a minha roupa à mão e esperar durante alguns dias que ela secasse
- ter de montar a minha mochila todas as manhãs, porque cada coisa encaixa num sítio próprio, e se precisamos de alguma coisa, é preciso tirar tudo e voltar a arrumar a mochila do início
- as madalenas ao pequeno-almoço, a única coisa que havia para comer em muitos sítios

Na lista dos "mi laiki" estavam:
- o silêncio no meio dos bosques
- o contacto com os outros peregrinos
- o Outono a chegar, com as folhas douradas a cair ao nosso lado quando atravessávamos os bosques
- as pessoas que se encontram e que têm sempre uma palavra amável para nos dizer, um cacho de uvas para oferecer, ou simplesmente algo para nos contar, como o pintor Luís, que encontrámos a caminho do Mosteiro de Obona, um espaço lindíssimo e abandonado, e que nos relatou a história do sítio. Pessoas maravilhosas que Santiago coloca no nosso Caminho. É essa a magia.

Ainda antes de chegar a Santiago, a minha lista das coisas de que não gostava foi diminuíndo, até ao ponto de hoje náo fazer sentido dizer que houve algo de que eu não tenha gostado.
Porque percebi que tudo faz parte e que, sem estas "dificuldades", o Caminho não faria sentido. Porque o melhor é as pessoas em que nos transformamos enquanto fazemos o Caminho e, se possível, depois dele.
A ambição, a ganância, a vontade de conquistar, de chegar antes dos outros, o individualismo, tudo isso se perde.

A minha amiga Pilar fez, nos últimos dias, uma tendinite num tornozelo, o que a obrigou a caminhar mais devagar, apesar de, por aquela altura, já estarmos tão habituadas a andar que conseguíamos fazer uma média de 5 km/h. O pé dela obrigou-me a mim, também, a abrandar o ritmo, mas nunca admiti seguir o Caminho ao meu ritmo e deixá-la para trás.
Porque a beleza é ir fazendo o Caminho, sem pressa de chegar, e desfrutar de cada momento, com as pessoas que estimamos.

JH

1 comentário:

Unknown disse...

O verdadeiro caminho... sabe-lo muito bem, só começou no teu regresso...

Bjs
70s